Deixar cair a Ucrânia “vai ter consequências para todo o mundo”

No dia em que passam dois anos desde a invasão da Ucrânia pela Rússia, a professora ucraniana Mariya Yukhymenko avisou que deixar cair a ajuda ao país terá impacto mundial e afetará os Estados Unidos. 

© D.R

 

“Não aprovar um novo pacote de ajuda terá consequências não apenas para os ucranianos mas para todo o mundo, incluindo os Estados Unidos”, disse à Lusa a professora de investigação e estatística da Universidade Estadual da Califórnia, em Fresno (sudoeste).

“Quer as consequências sejam diretas ou indiretas, afetarão toda a gente”, acrescentou.

Yukhymenko considerou “frustrante” o impasse sobre mais ajuda à Ucrânia e indicou que a recente queda da localidade de Avdiivka é um dos resultados da diminuição de recursos enviados à resistência ucraniana.

“Partilho dos receios sobre o que aconteceu em Avdiivka. Não quero chamar-lhe um ponto de viragem, mas de certa forma é isso, pelo menos de forma simbólica”, afirmou.

A docente, radicada na Califórnia, é natural de Chernihiv, uma das primeiras cidades cercadas pela Rússia após a invasão em larga escala.

A casa onde cresceu e onde os pais moravam foi danificada no quarto dia de ataques por um míssil lançado a partir da Bielorrússia. Yukhymenko conseguiu ajudá-los a fugir para um país da Europa Ocidental com auxílio de amigos, apesar do medo e idade avançada.

“Fugiram por sua conta e risco, porque não havia rota de evacuação”, contou. “Havia um avião russo a sobrevoar a estrada onde seguiam e não sabiam o que o piloto poderia fazer”, recordou

A irmã e sobrinhas permaneceram em Chernihiv e relatam alertas de raides diários, além de terem passado um ano com cortes de eletricidade durante 18 horas por dia.

“Pessoalmente, antecipo que isto vai levar vários anos”, indicou a professora, referindo que a invasão inicial da Ucrânia, com a anexação ilegal da Crimeia, aconteceu há dez anos.

“Penso que o objetivo último de Putin e da Rússia é anexar a Ucrânia”, salientou. “Creio que nunca admitiram que a Ucrânia tem um povo distinto e a sua própria cultura”, lamentou.

Yukhymenko cresceu a falar russo durante a União Soviética, porque a língua ucraniana era proibida. Só com a independência do país surgiram os primeiros canais de televisão em ucraniano.

Essa experiência, explicou, dá-lhe agora a possibilidade de perceber como a narrativa russa é espalhada pelo mundo.

“Estou preocupada com a difusão, volume e força da propaganda russa”, afirmou a docente. “Sendo alguém que nasceu durante a União Soviética, consigo compreender como a propaganda pode ser usada e espalhada de forma maciça”, continuou. “Esta propaganda está a ser espalhada não só em círculos específicos nos Estados Unidos, de forma estratégica, mas também na Europa”, alertou.

Um dos resultados é o bloqueio à ajuda para a Ucrânia.

Por outro lado, Yukhymenko acredita que o conflito Israel-Hamas tem influência russa. “O que está a acontecer no Mar Vermelho distrai a atenção das pessoas e canaliza recursos dos Estados Unidos”, frisou, referindose aos ataque dos rebeldes Huthis do Iémen contra navios, em solidariedade com Gaza.

A professora rejeitou a ideia de que enviar armas e ajuda para a Ucrânia é negativo para o país.

“Os Estados Unidos não perdem recursos ao doar armas que já são antigas”, considerou. “Na verdade é benéfico, tanto doar armas usadas como novas”, acrescentou.

Também a Casa Branca e outros especialistas têm defendido que o envio de armamento beneficia os fabricantes de armas norte-americanos e o auxílio contribui economicamente para empresas domésticas.

Olhando para o futuro, Mariya Yukhymenko não acredita que a solução seja “a Ucrânia ceder o seu território”, sublinhou. “Espero que a Ucrânia o defenda e recupere o que foi anexado ilegalmente em 2014”, adiantou.

“Quero que esta guerra termine. Quero os russos fora da Ucrânia”, afirmou. “Não são bem-vindos”, concluiu.

Últimas do mundo

A UNICEF alertou hoje para a grave situação de desnutrição aguda que se propaga rapidamente nas áreas controladas pelo Governo internacionalmente reconhecido do Iémen, com níveis “extremamente críticos” em crianças menores de cinco anos da costa ocidental.
Paetongtarn Shinawatra, filha do controverso bilionário e antigo primeiro-ministro tailandês Thaksin, foi hoje empossada como nova chefe de governo pelo rei Maha Vajiralongkorn, no final de mais uma crise política no país.
Uma organização não-governamental venezuelana denunciou que as mulheres detidas no país são constantemente sujeitas a tratamentos desumanos que vão de tortura física e psicológica à recusa de cuidados médicos adequados.
A Comissão Europeia enviou hoje um pedido de informações à Meta, ‘gigante’ tecnológica dona do Facebook e do Instagram, sobre a descontinuação do CrowdTangle, uma ferramenta para monitorizar desinformação ‘online’, questionando quais as medidas adotadas para o compensar.
A Conferência Episcopal Venezuelana (CEV) voltou hoje a pedir às autoridades que respeitem os direitos dos venezuelanos perante a “incerteza” dos resultados das presidenciais de julho, em que Nicolás Maduro foi reeleito, mas que a oposição contesta.
O Papa Francisco disse hoje estar muito preocupado com a situação humanitária em Gaza, e voltou a apelar para um cessar-fogo, pedindo ainda que seja seguido “o caminho da negociação para que esta tragédia termine logo”.
O número de 40 mil mortos hoje anunciado na Faixa de Gaza em dez meses de guerra com Israel representa um “marco sombrio para todo o mundo”, lamentou o alto-comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Turk.
A reunião promovida pelos mediadores internacionais para discutir um acordo de cessar-fogo em Gaza começa hoje em Doha, Qatar, e deverá prolongar-se durante vários dias, com a ausência do movimento islamita palestiniano Hamas.
Um ‘rocket’ caiu hoje ao largo de Telavive, de acordo com o Exército israelita, que reportou um disparo a partir da Faixa de Gaza, ataque já reivindicado pelo braço armado do Hamas palestiniano.
Três anos após o regresso dos talibãs a Cabul, o Afeganistão tem uma economia de "crescimento zero", com a população atolada na pobreza, uma crise humanitária que se agrava e sem esperança de melhoria num futuro próximo.