“Irão não atacou, retaliou” e cabe a Israel parar por aqui

A investigadora iraniana Ghoncheh Tazmini defendeu hoje que o Irão “não atacou Israel, apenas retaliou” e que Telavive deve parar por aqui para evitar uma escalada do conflito no Médio Oriente.

© Facebook de Ghoncheh Tazmini

 

Em declarações à agência Lusa, Tazmini, diretora de Investigação no Instituto Ravand de Estudos Económicos e Internacionais e que vive atualmente entre Portugal, Canadá e Reino Unido (tem tripla nacionalidade – iraniana, portuguesa e canadiana), sublinhou que a “natureza da retaliação” de Teerão foi “muito comedida, muito calibrada e muito coreografada”.

“A razão é que o objetivo não era militar, era uma demonstração política do princípio de que o Irão pode defender-se, ou deve defender-se (…) e isso explica por que o Irão continuou a invocar o Artigo 51 da Carta das Nações Unidas, que este é um ato de autodefesa e que opera no âmbito do direito internacional”, prosseguiu a escritora, investigadora e conferencista independente.

Para Tazmini, se a comunidade internacional, como a União Europeia (UE) ou os Estados Unidos, tivesse condenado ou incriminado o ataque de Israel ao consulado do Irão em Damasco (a 01 deste mês), “em violação flagrante dos regulamentos e convenções de direito internacional”, o Irão “teria repensado melhor a retaliação, porque teria entendido que não estava indefeso”.

Prova disso é o facto de países como a “Turquia e outros” terem sido “notificados” da intenção de Teerão 72 horas antes, segundo a diretora de Investigação no Instituto Ravand de Estudos Económicos e Internacionais – o primeiro grupo de reflexão iraniano independente, apartidário, privado, e não-governamental que se dedica a questões políticas importantes para o Irão.

Tal permitiu, sustentou, que Israel se preparasse para intercetar os ‘drones’ (aeronaves não tripuladas) e os mísseis balísticos e de cruzeiro, “o que sugere” que a ideia não era infligir danos cinéticos, mas sublinhar que o Irão tem o direito defender-se quando se encontra indefeso, após não haver incriminação do ato de agressão de Israel.

“A outra coisa é o facto de não ter havido vítimas civis, e essa não era a intenção, é uma prova disso”, sublinhou a autora do livro “Power Couple – Russian-Iranian Alignment In The Middle East”, publicado já este ano no Reino Unido.

Nesse sentido, Tazmini lembrou as reuniões de emergência tidas sobretudo no Conselho de Segurança da ONU, cujo secretário-geral, António Guterres, afirmou “de forma inequívoca” que é altura de evitar ações que possam levar a uma escalada de um confronto militar sob múltiplas formas no Médio Oriente.

“Penso que o mundo está a perceber que isto pode resultar em algo enorme e que, claro, ninguém pode dizer: ‘Israel, recue e não faça nada’. Mas penso que o facto de [o chefe da diplomacia britânica] David Cameron ter dito muito claramente que o ataque de Teerão foi uma dupla derrota e que não conseguiu infligir danos a Israel e que é uma influência maligna, pelo que não faz sentido realmente escalar é, de certa forma, dizer a Israel, ‘está tudo bem, isso foi um fracasso para o Irão, não há necessidade de retaliar, não há necessidade de fazer disso uma retaliação, vamos recuar’”, argumentou.

“Acho que essa é a mensagem. Penso que o potencial para que esta situação se transforme em algo de grande alcance, com consequências de longo alcance, serviu de impulso para vozes mais altas e vociferantes nos meios de comunicação social, nas organizações internacionais, e nas declarações feitas por funcionários de que precisamos de nos conter, precisamos de ser prudentes, precisamos de nos afastar da beira da destruição regional que tem implicações globais”, acrescentou.

Para a também licenciada em Relações Interacionais pela Universidade de British Columbia e pela London School of Economics, de Londres, doutorada na mesma temática pela Universidade de Kent, a “tendência terá de passar por um abrandamento da escalada” e tentar levar Israel a diminuir a tensão e a “empacotar tudo” como Cameron defendeu.

“Isto é, encarar tudo como um fracasso. Com é um fracasso, não há necessidade de responder precisamente por ser um fracasso. Acho que este tipo de embalagem do cenário é, de certa forma, uma mensagem para Israel: ‘Israel, vocês não perderam nada, então vamos evitar uma nova escalada, vamos deixar as coisas como estão e concluir esse capítulo’. Acho que esse é o sinal, essa será a trajetória futura”, afirmou.

“É uma situação muito complexa, por isso gostaria de pensar em todos os ângulos”, frisou Tazmini.

Últimas do mundo

A UNICEF alertou hoje para a grave situação de desnutrição aguda que se propaga rapidamente nas áreas controladas pelo Governo internacionalmente reconhecido do Iémen, com níveis “extremamente críticos” em crianças menores de cinco anos da costa ocidental.
Paetongtarn Shinawatra, filha do controverso bilionário e antigo primeiro-ministro tailandês Thaksin, foi hoje empossada como nova chefe de governo pelo rei Maha Vajiralongkorn, no final de mais uma crise política no país.
Uma organização não-governamental venezuelana denunciou que as mulheres detidas no país são constantemente sujeitas a tratamentos desumanos que vão de tortura física e psicológica à recusa de cuidados médicos adequados.
A Comissão Europeia enviou hoje um pedido de informações à Meta, ‘gigante’ tecnológica dona do Facebook e do Instagram, sobre a descontinuação do CrowdTangle, uma ferramenta para monitorizar desinformação ‘online’, questionando quais as medidas adotadas para o compensar.
A Conferência Episcopal Venezuelana (CEV) voltou hoje a pedir às autoridades que respeitem os direitos dos venezuelanos perante a “incerteza” dos resultados das presidenciais de julho, em que Nicolás Maduro foi reeleito, mas que a oposição contesta.
O Papa Francisco disse hoje estar muito preocupado com a situação humanitária em Gaza, e voltou a apelar para um cessar-fogo, pedindo ainda que seja seguido “o caminho da negociação para que esta tragédia termine logo”.
O número de 40 mil mortos hoje anunciado na Faixa de Gaza em dez meses de guerra com Israel representa um “marco sombrio para todo o mundo”, lamentou o alto-comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Turk.
A reunião promovida pelos mediadores internacionais para discutir um acordo de cessar-fogo em Gaza começa hoje em Doha, Qatar, e deverá prolongar-se durante vários dias, com a ausência do movimento islamita palestiniano Hamas.
Um ‘rocket’ caiu hoje ao largo de Telavive, de acordo com o Exército israelita, que reportou um disparo a partir da Faixa de Gaza, ataque já reivindicado pelo braço armado do Hamas palestiniano.
Três anos após o regresso dos talibãs a Cabul, o Afeganistão tem uma economia de "crescimento zero", com a população atolada na pobreza, uma crise humanitária que se agrava e sem esperança de melhoria num futuro próximo.